quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Ela cresceu, cresceu e cresceu. Enquanto andava, seu vestido azul esvoaçava, seus pés descalços pisavam a terra, o mato selvagem.

Com as duas mãos ela jogou suas ondas castanhas para trás, depois jogou a cabeça como uma leoa; o sorriso faceiro, malandro, os olhos negríssimos brilhando.

Ela andou por duas longas horas em meio as árvores até achar uma pequena clareira, iluminada pelo Sol. Ela rasgou o vestido que cobria seus seios. Pondo a mão dentro de onde havia rasgado, tirou um coração batendo e sangrando. Com a boca ela arrancou todas as artérias, uma por uma.

Com o rosto ensanguentado e a boca metálica, ela se ajoelhou sobre a terra, sobre o mato, sobre a pedra, sobre o galho, e com as mãos que pousaram o coração batendo, cavou um buraco à sua frente e enterrou o coração, pisando na terra que depois jogou por cima.

O silêncio era o Rei.

Todo seu corpo começou a dançar, a vibrar, a suar, a pular, a sorrir, a chorar. Sobre a terra seu corpo ria e chorava; dançava, dançava e dançava. Era uma explosão, um furacão. A Natureza estava ali conspirando a seu favor; A Vida estava ali conspirando a seu favor; O Silêncio estava ali conspirando a seu favor. A vibração, a tensão estava no ar, que se repuxava por todos os lados. E a cabeça dela se jogava de um lado para o outro, ela sorria e os cabelos voavam. Toda ela girava como a loucura em si. O vestido se abria e pulava com ela, como um reflexo do seu corpo. Ah, seu corpo tão consciente de si, tão ardente, tão se desejando, tão se amando. A terra se misturava ao sangue dos seus pés, se tornando parte dela, se ligando a ela, e a energia fluía e se jogava, se espalhava, se esbanjava.

O Céu estava ali, a olhando do alto, a recebendo, sentindo-a chegar cada vez mais perto.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Ela abriu as suas asas, alvas como apenas as suas asas podiam ser. Seus delicados pés descalços se levantaram nas pontinhas dos dedos, como fazem as bailarinas do Bolshoi.

Seus braços se armaram, seguindo a direção das asas, e aos poucos seus músculos foram relaxando, relaxando; relaxando foram os músculos do braço e das pernas - mas sem trair sua posição. Depois foi descendo pela espinha, relaxando os músculos do peito e da barriga, em um trajeto libertador.

O Ar, seu amigo, a acariciava no rosto, entre as pernas nuas, na barriga e nos seios puros. Passeava pelo seus braços e fazia cócegas nos seus pés. Ele soprou sua nuca, e levantou seus cabelos negros e curtos.

A mente dela começava a limpar, se abrir, a se lavar. Sua cabeça, antes lotada de pensamentos, agora esvaziava aos poucos. As imagens e os sons eram bloqueados.

E sua cabeça esvaziava, esvaziava, esvaziava, esvaziava...






























... esvaziou e ela pulou.

Pulou sem nem sentir, caiu em queda livre. O Ar, seu amigo, soprou com força e delicadeza, combinação que apenas à ele é permitida, estufando as asas dela.

De uma só vez, as asas a puxaram para trás, depois ela rodopiou, rodopiou e rodopiou até o vento soprar outra vez, mas desta vez como quem diz:

- Vai! Seja livre! Voe e voe, e nunca mais volte, pois eu sacrifico meu amor por ti como o preço a pagar por sua liberdade. Vai! E voe como um pássaro, uma fênix, um anjo. Não irei contigo. Esta jornada será solitária, deixar-te-ei para todo o sempre, pois é isso que mereço, é isso que mereces. Vai! E conheça a solidão, que é épica, que ama a todos como ninguém, que amar-te-á como eu te amei.

E ela planou com as asas abertas, sem levar aquelas palavras no coração, mas carregando um sorriso que já dizia tudo. O sorriso do amor que apenas uma anja pode ter. Um amor que, de tão grande, se deixou ir, sem uma vez olhar para trás, sem uma vez derrubar uma lágrima, mas amando, para sempre amando.
Desejar alguém que não se pode ter é um dos cânceres da humanidade. É aquele sentimento agonizante como o fogo, que deixa um espaço aberto no meio da barriga, ou melhor, é como um polvo que se amarra ao redor da barriga, joga um dos tentáculos no coração, outro (o melhor) lá no ventre, e puxa tudo de uma vez. Pode parecer masoquista, mas a dor de se desejar alguém que não se pode ter é uma dor prazerosa, que dá gosto, faz tudo se mexer, se avivar, é oxigênio no fogo.

O problema é quando o desejo não correspondido se torna paixão não correspondida. Aí é água no fogo, é um gelo, é uma agonia odiosa, que retesa os músculos e abre todo o seu corpo. O polvo vai embora e deixa nada no lugar. Ah, os meu platonismos ainda me matam!

E quando a gente se sente correspondido? Fica tudo mais colorido, né? Até seu dente torto parece uma graça no espelho! Depois a gente esquece Platão e a vida dá um oi...